sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

E continuamos entorpecidos...

Quando um novo ano começa, fazemos planos; criamos metas; somos tomados por uma esperança e um sentimento de renovação inexplicáveis. Não sei se por ingenuidade, hábito, necessidade ou instinto de sobrevivência, criamos esta fé de que tudo vai mudar (para melhor, claro) junto com a mudança do ano. É quase um delírio coletivo, algo inexplicavelmente partilhado por todos, independente de religião, classe social, formação, etc...

Como se toda a sujeira do mundo, assim como as nossas próprias, ficassem para trás, fossem deletadas da nossa biografia para que uma nova história começasse a ser escrita.
Confesso que também me enchi desta tal esperança. Fiquei mergulhada neste “delírio de fé” esperando um 2012 mais feliz, mais humano.
Mas, infelizmente, estamos ainda no primeiro mês deste tal “novo ano” e já acordei deste sonho. Como Alice retornando do País das Maravilhas ou Poliana perdendo todo seu otimismo de uma vez só.
Não sei se o mundo vai acabar, como previu o povo maia. Mas, por este início de ano, a sensação é que a humanidade está acabando um pouco mais a cada dia.
O ano começa com uma “política higienista” (muito mal) camuflada de “política de saúde”, que ARRANCA usuários de drogas do centro da cidade, sem a menor preocupação e estrutura para seus cuidados básicos. Pessoas há muito adoecidas, emocional-social e fisicamente destruídas pela droga e pelo abandono, que são tratadas pelos políticos e pela sociedade como fantasmas, monstros, estorvos, obstáculos, pedaços de carne que atrapalham a “reestruturação do centro de SP”.  Impedem o trânsito livre de outros paulistanos na região que “dominaram”.  Ué, mas não teriam eles os mesmo direitos que os demais? A população não pode transitar por lá, principalmente, porque não querem encarar a degradação de seus semelhantes, mas eles também não podem transitar por outros lugares. Afinal, que morador de Higienópolis quer ver estes “fantasmas” nas portas de suas belíssimas casas?
Como disse um professor-supervisor-orientador em uma palestra recente, a Cracolândia nada mais é do que um reflexo da nossa sociedade, que busca prazer a todo custo e se esquiva de toda dor. Não é o crack uma droga de prazer rápido? Quem sente dor ou fome ou tristeza estando tão anestesiado?
Na belíssima letra de Renato Russo “Nos deram espelhos e vimos um mundo doente.”
A Cracolândia é o nosso espelho. Não são seres de outro mundo que ali estão adoecendo. Não são nem de outro país. Não são eles, somos NÓS.
Somos cada uma daquelas crianças com a vida tão cedo destruída. Somos cada um daqueles homens há muito sem um lugar para voltar. Somos aquelas meninas grávidas, que terão filhos doentes, já viciados, talvez infectados pelo HIV. Somos aqueles seres humanos abusados, violentados, espancados, ignorados.
Mas, enquanto eles estão em uma rua; em uma região distante; em um lugar que não precisamos passar, freqüentar, visitar; está tudo bem. “O que os olhos não vêem o coração não sente”, não é?
Não deveria. Que tipo de humanos somos nós se desprezamos nossos semelhantes? Que tipos de religiosos são alguns, se esquecem daquele mandamento que me parece o principal “Amai o próximo como a si mesmo”? O próximo é qualquer um, não é? Até onde sei, Jesus não rejeitou ninguém, ele ajudou prostitutas, leprosos, cegos e tantos outros. Ele, com certeza, estaria ali acolhendo aqueles humanos da Cracolândia.
Não sei qual é a solução para este imenso problema das drogas. Mas, tenho certeza que enxergar o humano que existe por trás do “drogado” do “dependente” do “marginal” é o passo inicial. Já que o governo (todos) e a polícia não conseguem fazer isso, nós enquanto sociedade civil e, mais ainda, como profissionais de saúde temos esta obrigação humana, social, ética.

SE não bastasse este desastre, 2012 já trouxe outras bizarrices: um estupro televisionado; uma falsa mãe de quadrigêmeos, a corrupção atingindo níveis inimagináveis (em todos os partidos), um garoto negro expulso de um restaurante "de elite", um navio que afunda por irresponsabilidade de um humano, mais mortes no trânsito, mais animais sendo mal-tratados.
Não dá mais para manter meu “delírio de fé”, a vida real não permite.
E sabe o que mais me entristece, que as pessoas parecem naturalizar tudo isso. Mais uma vez, parece que estamos todos entorpecidos...
Enquanto tudo isso acontece, nas redes sociais se discute BBB; a viagem para o Canadá de uma desconhecida; um programa que trata da vida de mulheres ricas, fúteis e esnobes e tantas outras banalidades que nem sei descrever.
Parece que ficamos tão vidrados, hipnotizados diante das telas da televisão ou de um computador que só vemos o mundo através disso. Como diria Ernesto Sábato, preferimos olhar paisagens pela TV a olhar pela janela.
E, em meio a estas reflexões, me deparei com este belíssimo vídeo que discute, justamente, nossa total alienação. Mostra o quanto estamos nos desconectando cada vez mais da natureza, dos animais e dos outros humanos. Sentindo cada vez menos o que está à nossa volta e ficando cada vez mais alienados e anestesiados diante de telas de TV ou computador. Olhamos tanto o mundo através destas telas, que nem percebemos que ele está sendo destruído, que a humanidade está sendo derrotada, que o nosso lado humano está sendo aniquilado e que estamos ficando cada vez mais insensíveis e isolados. E ainda dizemos que louco é o outro...

Enfim, para quem estiver a fim de pensar sobre isso, segue o vídeo:



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